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Compreender a nossa mente

Para compreendermos porque é que precisamos de compaixão, é fundamental perceber a nossa mente. Efetivamente o cérebro humano é complexo, tem competências maravilhosas, mas na verdade não está muito bem construído e por vezes pode ser destrutivo, cruel e até um pouco maluco, podendo causar problemas e sofrimento. Isto não é culpa de ninguém, é apenas resultado da forma como o cérebro evoluiu​.

Compreender a mente - 2

Há cerca de dois milhões de anos atrás, os nossos antecessores primatas começaram a desenvolver uma série de capacidades cognitivas – o chamado “novo cérebro”. Como consequência disso hoje somos capazes de raciocinar, antecipar, imaginar, usar a nossa linguagem e símbolos, ter um sentido de nós mesmos enquanto indivíduos – de um modo que nenhum outro animal consegue. Também conseguimos auto-monitorizar-nos – conseguimos pensar sobre nós mesmos, o que se passa no nosso corpo ou na nossa mente. Por exemplo, nunca veremos um chimpanzé sentado debaixo de uma árvore a tentar resolver problemas: como cultivar alimentos para o inverno? Como construir um abrigo melhor do que o do ano passado?… Como preparar armadilhas para capturar animais? No entanto, tragicamente, os humanos modernos podem não só fazer isto como também aplicar a sua inteligência para construir armas nucleares ou para explorar e enganar as outras pessoas e muito mais.

Para além disso, também conseguimos monitorizar o que sentimos no nosso corpo, as nossas emoções, os pensamentos que estamos a ter. Podemos usar isto para fazer juízos de valor sobre nós mesmos e estes, por vezes, podem ser muito negativos. Também nunca encontraremos um chimpanzé a ruminar sobre a sua saúde… ou sobre o que fazer quando aumenta de peso ou porque é que se sente inferior… ou sobre o que o futuro lhe reserva-…. Ou sobre o que os outros chimpanzés pensam dele… ou a criticar-se por ter feito algo de que se arrepende. O “novo cérebro” dos humanos permite-nos pensar sobre estas coisas, para o bem e para o mal. Através do treino da compaixão é importante começar a compreender e a reconhecer que enquanto o nosso “novo cérebro” nos pode ser muito útil, infelizmente também podemos usá-lo para fins muito destrutivos e prejudiciais para nós próprios e para os outros. Saber isto é importante porque nos ajuda a ver mais claramente como as nossas mentes funcionam e o que guia o comportamento (o nosso e o dos outros), e esta compreensão é a base para que possamos assumir responsabilidade sobre as nossas mentes e sobre os comportamentos que temos em relação a nós mesmos e aos outros.

Criando loops na mente

Criando loops (ciclos viciosos) na mente

Outra razão pela qual a mente humana nos pode causar muita dor e sofrimento é porque conseguimos manter na nossa mente coisas que estimulam emoções dolorosas. Imagine uma zebra a fugir de um leão. Assim que consegue escapar, ela vai acalmar-se e voltar a pastar com as outras zebras. Na situação da zebra, o ser humano, apesar de se sentir aliviado por ter conseguido fugir, poderia também começar a imaginar e a ruminar sobre o que teria acontecido se o leão o tivesse apanhado:"Já imaginaste o que seria ser sufocado até à morte ou ser comido vivo!"… “Imagina o que pode acontecer amanhã se houver dois leões... ".O cérebro humano é capaz de constantemente imaginar o pior: "o que aconteceria se...”“e imagina que... e se…". Ao manter este tipo de pensamentos na mente da forma como o fazemos, podemos estar em estados de stress, preocupação e ansiedade constantes. Somos capazes de ruminar sobre uma situação que tenha ocorrido durante horas, dias, semanas… ou mesmo meses! Lembre-se de que isso não é culpa nossa, é apenas a forma como a mente funciona…a menos que aprendamos a perceber que ela está a fazer e como mudar o foco da nossa atenção.

A ciência, incluindo a nossa investigação, tem demonstrado que os seres humanos conseguem estimular emoções e sensações corporais (e.g., hormonas de stress ou de tranquilização) através daquilo em que se concentram e que imaginam. Por exemplo, se estiver deitado na cama à noite a pensar numas férias que deseja muito, vai sentir-se entusiasmado e estimular sensações corporais (e.g., adrenalina). Se, por outro lado, estiver a ruminar sobre uma discussão que teve, então serão estimulados sentimentos de raiva e hormonas de stress. Se estiver preocupado com as suas finanças, então sentirá ansiedade no seu corpo… e claro que sabemos o que acontece se estiver a fantasiar algo erótico(!)… Isto mostra como os nossos pensamentos têm consequências psicológicas e físicas.

Portanto, temos um cérebro que é muito diferente do dos outros animais, porque nós podemos estimular as nossas próprias emoções e por sua vez sensações corporais – algumas negativas, outras positivas. Contudo, como irá aprender, também podemos observar-nos a nós mesmos a fazer isso, e talvez optar por alterar o que se passa nas nossas mentes – chamamos a isto tornar-se mindful ou conscientes da nossa mente. Como irá descobrir é muito importante tomar consciência do que estamos a estimular em nós mesmos, bem como do que estamos a pensar e a prestar atenção, porque tudo isso tem um impacto no nosso bem-estar e no dos outros.O treino da compaixão ajuda a fazer isso e, em especial, ajuda-nos a focar a nossa atenção nos nossos pensamentos e emoções e a estimular o nosso cérebro de uma forma que nos proporcione bem-estar físico e psicológico.

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A compaixão pode, deste modo, ajudar-nos a ver que algumas das causas do nosso sofrimento têm que ver com sistemas cerebrais básicos que não escolhemos. Através da compaixão e de psicoeducação que iremos apresentar irá compreender que o cérebro humano é de facto muito complicado e consegue muito facilmente cair em estados de ansiedade, depressão ou até mesmo crueldade. A compaixão convida-nos a treinar o nosso cérebro de forma a estarmos menos propensos a cair nas suas armadilhas. A compaixão e a prática destes exercícios faz com que seja menos provável que nos deixemos apanhar em ‘auto-monitorização’ excessiva ou a ‘criticar-nos a nós próprios ou aos outros’. Somos mais capazes de tomar consciência de quando os nossos cérebros estão a fazer coisas que podemos, a longo prazo, não querer que eles façam – como manter-nos em estados de raiva ou ansiedade. 

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